Em uma civilização de massas, o público não está em contato direto com os fatos culturais, mas se informa sobre eles através dos meios de comunicação. A audiência de massas não vê, por exemplo, uma exposição, não presencia um happening ou uma partida de futebol, mas vê a sua projeção em um noticiário. Os fatos artísticos reais deixam de ter importância quanto a sua difusão, já que só chegam a um público reduzido. “Distribuir dois mil exemplares de uma obra em uma grande cidade moderna é como disparar um tiro no ar e esperar que caiam os pombos” – disse Nam June Paik. Em última instância, não interessa aos consumidores de informação se uma exposição se realiza ou não; só importa a imagem que o meio de comunicação constrói desse fato artístico.
A arte atual (fundamentalmente o pop) tomava, às vezes, para a sua constituição, elementos, técnicas, da comunicação de massas, desconectando-as do seu contexto atual (por exemplo, Lichtenstein com os quadrinhos, ou D’Arcangelo com os sinais de trânsito). À diferença do pop, nós pretendemos constituir as obras no interior dos meios. Deste modo nos propomos entregar para a imprensa o informe escrito e fotográfico de um happening que não aconteceu. Esse falso informe incluirá os nomes dos participantes, uma indicação do lugar e do momento em que se realizou e uma descrição do espetáculo que se finge ter ocorrido, com fotos tomadas dos supostos participantes em outras circunstâncias. Assim, no modo de transmitir a informação, no modo de realizar o acontecimento inexistente, nas diferenças que surjam entre as diversas versões que do mesmo evento faça cada emissor, aparecerá o sentido da obra. Uma obra que começa a existir no momento mesmo em que a consciência do espectador a constitui como já concluída.
- Existe, pois, uma tripla criação:
- a redação do falso informe;
- a transmissão que de tal informe realizam os canais de informação;
- a recepção por parte do espectador que constrói – a partir dos dados recebidos segundo a significação que para ele adquirem esses dados – a espessura de uma realidade inexistente que ele imagina verdadeira.
Levamos assim até sua última conseqüência uma das características dos meios de comunicação: a des-realização dos objetos. Deste modo se privilegia o momento da transmissão de uma obra mais do que o momento da sua constituição. A criação consiste em deixar sua constituição vinculada a sua transmissão.
Atualmente, a obra de arte é o conjunto dos resultados de um processo que começa com a realização de uma obra (tradicional) e continua até que tal obra se converta em material transmitido pelos “mass media”. Agora, propomos uma “obra de arte” na qual desapareça o momento de sua realização, já que assim se comentaria o fato de que essas obras são, na verdade, um pretexto para pôr em marcha o meio de comunicação.
Do ponto de vista do espectador são possíveis, para esses tipos de obras, duas leituras: por um lado, o espectador que confia no meio e crê no que vê; por outro, o do espectador prevenido que está ciente da inexistência da obra que se noticia.
Abre-se assim a possibilidade de um novo gênero: a arte dos “mass media”, para a qual o que importa não é fundamentalmente “o que se diz”, mas sim tematizar os meios como meios.
Esse informe prepara, além disso, os destinatários da segunda leitura, “previne” alguns leitores e constitui a primeira parte da obra que anunciamos.