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“Onde está sua ruptura?”
por Victor da Rosa
Do que trata Divórcio, o novo romance de Ricardo Lísias? Para tentar responder a pergunta, primeiro é preciso passar por duas ou três respostas óbvias. O próprio narrador, em um de seus vários momentos autorreflexivos, diz se tratar de um romance sobre o amor. É uma boa resposta, mas provavelmente incompleta. Não seria nenhum disparate sugerir, por outro lado, que o romance consiste em uma espécie de manifesto contra certos pressupostos do jornalismo, lembrando As ilusões perdidas, de Balzac, mas esta tampouco é uma resposta suficiente. Naturalmente, trata-se também de um livro sobre o divórcio, ou seja, da “separação de cônjuges por meio da dissolução do matrimônio”, mas é o sentido figurado da palavra divórcio que parece ainda mais eficaz para a leitura do romance: separação, desacordo e corte. |
Divórcio
de Ricardo Lísias
Rio de Janeiro: Alfaguara, 2013 |
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MÃOS
AO ALTO: OLHOS ARMADOS
por
Vinícius
Honsko
Didi-Huberman
irá retomar nessa série todo o
problema do saber histórico, do como posicionar-se, do como
jogar anacronicamente
para desmontar, montar e remontar nossas imagens de modo a criar, a
partir da visibilidade
e da temporalidade,
sua legibilidade (fazer
delas questão de
conhecimento, não de
ilusão). Tirar da imaginação sua
conotação negativa, sua
ligação com a simples ilusão, com a
miragem: esse tem sido o trabalho de Didi-Huberman na última
década.
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Remontages
du temps subi
(L’oeil
de l’histoire, 2)
de
Georges
Didi-Huberman
Paris: Editions de
Minuit, 2010 |
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A
fabricação do humano (resenha)
por
Alexandre Nodari
Resposta
aos amigos do SOPRO (resposta
do autor)
por
Fabián
Ludueña Romandini
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La
comunidad de los espectros. I. Antropotecnia
de
Fabián
J. Ludueña Romandini
Buenos Aires, Mino
y D’Avila editores, 2010 |
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De
como apaziguar demônios:
renascimento,
potência e ascese
por
Leonardo
D’Avila de Oliveira
Indagado
pela máxima de
Warburg, segundo a qual as divindades pagãs nunca cessaram
de estar presentes enquanto demônios cósmicos na
cultura européia, de modo que de tempos em tempos essas
forças ressurgem, o jovem filósofo argentino
Fabián Ludueña procura em seu livro
Homo Oeconomicus, tese
defendida em 2005 sob a orientação de Roger
Chartier, publicado em Buenos Aires em 2006, esclarecer o lugar do
florentino Marsilio Ficino como um importantíssimo marco
dentro da metafísica ocidental.
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Homo
oeconomicus
Marsilio
Ficino, la teologia y los mistérios paganos
de
Fabián
J. Ludueña Romandini
Buenos Aires, Mino
y D’Avila editores, 2006 |
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Com
Maria e Marcel, à margem
por
Eduardo Sterzi
Dando
prova da rara coerência interna dessa obra, o novo livro se
abre, já em sua introdução
(antecipando um tópico que será desenvolvido no
primeiro capítulo), com uma citação de
outra narrativa, entre ficcional e memorialística, da Semana
Trágica: desta vez, trata-se de uma passagem de Koshmar,
relato escrito em íidiche por Pinie Wald,
operário judeu acusado falsamente de ser o líder
de um (fictício: inexistente) Soviete argentino. Este
é o ponto de partida eleito por Antelo para seu livro, cujo
propósito, declarado liminarmente na mesma
introdução, é “ser a
reconstrução de um sistema de saber, um conjunto
heterogêneo, quando não abertamente
miscelâneo, de objetos culturais” (...)
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Maria
com Marcel
Duchamp
nos trópicos
de
Raúl
Antelo
Belo Horizonte:
Editora UFMG, 2010 |
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“Misturar
desejo com história”
por
Flávia Cera
Se fosse
possível
sintetizar em uma expressão o livro Uma
Fome, de Leandro Sarmatz, essa
que dá título à resenha talvez fosse a
mais apropriada. E, o fato de ela estar no conto
Barra da Tijuca, manhã do dia 5 de junho,
em que “um cara com PhD em estudos culturais”
é convidado para escrever o roteiro de um programa especial
de natal para a televisão, marca-a como um sintoma do nosso
tempo em que academia e televisão quase se confundem, assim
como ficção e realidade, passado e presente. Se,
por um lado, não temos um reduto que nos garanta qualquer
estabilidade, por outro, temos o desafio, não menos
estimulante, de não ter fronteiras, de podermos transitar
livremente por aqui e por ali.
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Uma
fome
de
Leandro Sarmatz
Rio de Janeiro:
Record, 2010 |
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O
esporte ou o espelho do espetáculo
por
Victor da Rosa
Le
sport et les hommes (traduzido
para o espanhol em 2008, por Núria Petit
Fontseré, em publicação da
Paidós - edição em que se baseia esta
resenha), curioso texto sobre exatamente cinco esportes –
tourada, automobilismo, ciclismo, hockey e futebol, nesta ordem
–, escrito exclusivamente para um documentário de
Hubert Aquin, deve ser lido como uma espécie de
continuação do projeto crítico
já presente em Mitologias
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Del
deporte y los hombres
de
Roland Barthes
Tradução
para o espanhol de Núria Petit Fontseré
Buenos Aires: Paidós, 2008 |
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Um
réquiem para a escrita?
por
Alexandre Nodari
O ocaso
da escrita seria o sintoma
de um ocaso maior, a decadência de todo um modo de pensar e
agir, a decadência da
“história” e mesmo da
“política”. Pois se, para Flusser, a
escrita seria política porque se dirige ao outro, precisa do
outro, o código digital, por sua vez, seria despolitizado
porque se dirige à máquina, utilizando a forma da
“prescrição” (a forma do
“se... então”), mas
destituído de valores – totalmente funcional (uma
norma que se limita a programar uma máquina a fazer algo)
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A
escrita
Há
futuro para a escrita?
de
Vilém
Flusser
Tradução
de Murilo Jardelino da Costa
São Paulo, Annablume (Col.
Comunicações), 2010
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Um
corpo do tamanho do mundo
por
Flávia Cera
Emanuele
Coccia, jovem filósofo italiano, vem desenvolvendo, uma
leitura fundamental sobre a imagem, que altera radicalmente a
compreensão de uma série de pressupostos que
perseveraram por muito tempo. Em A
vida sensível,
publicado pela editora Cultura e Barbárie, Coccia apresenta
uma reflexão contundente (que supera, evidentemente, as
fronteiras da filosofia e alcança a psicanálise,
a antropologia) sobre uma física do sensível e
uma antropologia da imagem, deslocando o sensível do
psíquico, colocando-o em um fora absoluto e afirmando que o
que difere o homem não é a racionalidade, mas uma
especial relação com as imagens.
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A
vida sensível
de
Emanuele Coccia
(Tradução
de Diego Cervelin)
Desterro, Cultura e
Barbárie (Col. PARRHESIA), 2010
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Um para cem? 99 poemas
de Brossa
por
Pádua
Fernandes
O poeta e
historiador Ronald
Polito já nos deu, do catalão Joan Brossa
(1919-1998), os Poemas Civis,
traduzidos com Sérgio Alcides, e Sumário
Astral e outros poemas.
99 poemas, com
traduções apenas de Polito, e organizado e
selecionado por ele e Victor da Rosa, inicia-se com uma breve
apresentação escrita pelo segundo organizador que
pode ser resumida às frases finais: “90 anos de
vida, 10 anos de morte, 99 poemas. É quase magia.
São coisas que, afinal, só podemos aprender com
Brossa.”
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99
Poemas
de
Joan Brossa
(Tradução
de Ronald Polito)
Seleção de Ronald Polito e Victor da Rosa
São Paulo, Annablume (Selo Demônio Negro), 2009 |
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As
assinaturas de uma política que vem
por
Vinícius
Honesko
Talvez
a fama recente e repentina alcançada por Agamben nos
últimos tempos aqui no Brasil – principalmente por
ocasião da publicação das
traduções de seus livros – possa
ensejar uma dispensa de apresentações.
Porém, não compreendemos sua
trajetória intelectual e tampouco sua estratégia
de pensamento se não nos ativermos a um detalhe: Agamben
não tem como formação primeira a
filosofia, mas sim o direito. Ele próprio afirma, em
entrevista concedida a Roman Herzog, que depois de ter
concluído seus estudos em direito pensou que os havia
abandonado para sempre. No entanto, assume que a lógica
férrea do direito, sobretudo a do direito romano,
é algo que jamais alguém pode abandonar por
completo e que, justamente por isso, o acompanha até hoje.
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Signatura
rerum
Sul
metodo
de
Giorgio Agamben
Turim, Bollati
Boringhieri, 2008 |
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O
espetáculo da barbárie: fotografia,
tortura e lynching
por
Sílvia
Regina Lorenso Castro
As
fotografias tiradas durantes os lynchings
mostram não apenas os corpos em chamas, degolados, cortados,
mas pessoas fazendo poses, sorrindo e orgulhosas por participarem de um
ato que visa mostar aos negros o que pode acontecer se “eles
não souberem o seu devido lugar.” Mais assustador
ainda é o fato de que muitas dessas fotos foram
transformadas em cartões-postais, enviados
àqueles que não puderam comparecer ao
espetáculo da barbárie.
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Whitout
Sanctuary
lynching
photography in America
de
James Allen,
Hilton Als, John Lewis e Leon Litwack
Santa Fe, Twin Palm
Publishers, 2000 |
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O
precipitar da imaginação
por
Leonardo
D'Ávila de Oliveira
A
tradução do pouco conhecido Tratado
da Magia de Giordano Bruno
demonstra que
mesmo em um mundo em que houvesse algum paralelo entre as palavras e as
coisas,
a linguagem seria inexata e a comunicação
impotente. (...) Por mais que o saber não seja pensado
separado do mundo, como no binômio sujeito-objeto, existiriam
afinidades, semelhanças e simpatias (ou antipatias) que
demonstram oposições naturais. Além
disso, a linguagem chega a ser diretamente posta à prova
quando o pensador avalia a incapacidade das línguas
conseguirem passar alguma plenitude de sentido, principalmente se
comparadas com as mensagens e enigmas divinos que são
obtidos, por exemplo, nos sonhos.
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Tratado
da Magia
de
Giordano Bruno
(Introdução, tradução e
notas de Rui Tavares)
São
Paulo, Martins Editora, 2008 |
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Um
jagunço de posse da eletricidade
por
Alexandre Nodari
“La
Historia es mera
exterioridad de la ficción”. Tal
sentença, verdadeiro “objecto gritante”
que encontramos em Crítica
Acéfala recapitula
– no duplo sentido de cumprimento e
abolição – o percurso
crítico de seu autor, Raúl Antelo. (...) Ou seja,
a história – a História
universal da infâmia
– não pode ser prevista porque ela é
exterioridade de uma exterioridade (a ficção). A
leitura não prevê porque não
há o que ser previsto. Ou melhor, porque a linguagem
não serve para prever. A história só
se repete como farsa; a literatura, como paródia. Em ambos,
nos encontramos diante de um novo gesto humano, de um novo gesto de
linguagem. E cada novo gesto re-presenta um recomeço, um
nascimento, como diria Hannah Arendt - e uma chance de felicidade
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Crítica
Acéfala
de
Raúl
Antelo
Buenos Aires,
Editora Grumo (Coleção Materiales), 2008 |
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