Saiu hoje, no caderno Cultura do Diário Catarinense, uma resenha minha sobre o belíssimo livro de Eduardo Sterzi, A prova dos nove.
Saiu hoje, no caderno Cultura do Diário Catarinense, uma resenha minha sobre o belíssimo livro de Eduardo Sterzi, A prova dos nove.
-Fernando Gabeira: "Eu sou o Fernando Gabeira, tenho 50 anos de vida pública, não sou um político qualquer."
(Fonte: G1)
LEGENDA
"Tenho 40 anos de vida pública e ninguém pode apresentar qualquer prova contra a minha honestidade. Podem falar do meu temperamento, mas nunca de falta de honestidade. Esse é meu trunfo"
(ACM, PFL,14/03/2000)
"Não vou perdoar criminosos e quero que a lei seja cumprida. Não vou permitir que meus 38 anos de vida pública sejam achincalhados."
(Jorge Bornhausen, PFL, 28/10/2005)
"Depois de 40 anos de vida pública, do dia para a noite, fui transformado no chefe do "mensalão", em bandido, no maior corrupto desse país"
(Zé Dirceu, PT, 01/12/2005)
"Os recursos que recebi não eram "propina", como afirma o jornalista, incorrendo em calúnia. Tenho quase 30 anos de vida pública e jamais esse termo foi usado em referência a mim e/ou a minha atuação na política."
(João Paulo Cunha, PT, 09/12/2005)
"Depois de 32 anos de vida pública, não tenho patrimônio, e o que me acusam é porque a minha mulher usou um vestido que depois doou para uma entidade"
(Geraldo Alckmin, PSDB, 20/10/2006)
"É um parlamentar com mais de 20 anos de vida pública, marcada pela correção de seus atos e o compromisso com a democracia e justiça."
(Nota do PSC sobre o parlamentar Mário de Oliveira, acusado de mandar matar o também deputado Carlos Willian, 27/06/2007)
"Tenho 30 anos de vida pública honesta, não tenho nenhum tipo de denúncia."
(Carlos Lupi, PDT, 11/03/2008)
"Tenho 41 anos de vida pública sem uma condenação."
(Paulo Maluf, PP, 20/06/2008)
etc. etc. etc.
Fonte: Folha de S. Paulo
(Inauguro, com este post, a nova seção deste blog, em
parceria com meu amigo e colega Christiano Balz, desenhista de primeira. A
idéia para esta primeira entrada da Enciclopédia partiu - isto é, foi roubada -
de uma fala de Carlito Azevedo, a quem vai dedicada).
Mercado: Bebê gigante que governa
os homens da Terra. Tem variações horríveis de humor, passando de calmo a
nervoso
A prisão do orelhudo Daniel Dantas, além de ser motivo de comemoração, revela uma das diferenças cruciais entre a Era FHC I, do Príncipe da Moeda, e a Era FHC II, do Sapo Barbudo: a atuação republicana da Polícia Federal. Os melhores veículos pra se entender este mafioso que fez fortuna com a privataria são o Conversa Afiada do Paulo Henrique Amorim - que se aliaria ao Diabo para derrotar DD, se estivessem no Inferno -, a Carta Capital, e a Terra Magazine, do Bob Fernandes. A grande mídia está toda nas mãos do Orelhudo, como sempre argumentam os veículos supra-citados e Luís Nassif - e como se pode ver no delicioso ranking de nervosismo feito pel'O Biscoito Fino.
Do Light ao Zero
O amigo Leonardo D'Ávila, do Quarentena, escreveu um excelente post, a partir da nova "Lei Seca" pátria, sobre a passagem da sociedade Light à sociedade Zero. Este clima de assepsia, já visível na ostensividade do anti-tabagismo vigente, não é sem relação com o fascismo (vale a pena ler, neste sentido, uma coluna antiga de João Pereira Coutinho na Folha Online sobre as "patrulhas higiênicas, escrito a partir da leitura de The Nazi War on Cancer de Robert Proctor).
Mercado
Carlito Azevedo esteve aqui em Florianópolis duas semanas atrás. Da sua fala, gostaria de destacar a ótima sacada que teve em relação ao "nervosismo" ou o "bom humor" do Mercado: se uma catástrofe acontecesse extinguindo a humanidade e seres alienígenas viessem parar no Planeta, teriam a impressão, lendo nossos jornais, de que éramos governados por um Bebê gigante e superpoderoso, o "Mercado" que, de acordo com o seu humor, poderia acabar com o mundo. O poeta destacou também que, ao lado desta "humanização" do discurso econômico, há uma "economização" do discurso das relações humanas - "estou investindo nesta relação", por exemplo. O "Mercado" teria, assim, dominado todas as esferas humanas, causando uma despolitização nas discussões de todas as searas - na literária, o reflexo disso seria a idéia de que um bom soneto equivale a um bom poema concreto, pelo critério de "qualidade" -, uma espécie de consenso (que, fazendo uma ponte com a idéia da Sociedade Zero, é violentíssima, asséptica, uma forma de censura). E é contra este consenso que se voltaria a atividade editorial de Carlito: a Inimigo Rumor, que completa 10 anos com o seu vigésimo número, seria justamente isso: um pequeno balbucio, um murmúrio (como toda a poesia) contra o consenso.
Indicações
O amigo Victor da Rosa, no seu Notícias de Três Linhas, publica, além de seus ensaios sempre muito bem escritos, posts maravilhosos e muito engraçados, como o Literatura de Morto e Três Aforismos na VAN. Vale a pena ler.
Bares proletários: que post maravilhoso no Flanagens!
Raúl Antelo lançou, no último dia 9, em Buenos AIres, o Crítica Acéfala, pela Grumo. No lançamento, falaram Gonzalo Aguilar e Daniel Link - e o belíssimo texto deste último está reproduzido em versão curta e completa.
"Who he was who first,
without ever having gone out to the rude chase, told the wandering cavemen at
sunset how he had dragged the Megatherium from the purple darkness of its
jasper cave, or slain the Mammoth in single combat and brought back its
gilded tusks, we cannot tell, and not one of our modern anthropologists, for
all their much-boasted science, has had the ordinary courage to tell us. Whatever
was his name or race, he certainly was the true founder of social intercourse."
(Oscar Wilde, The Decay of Lying)
A recente operação de libertação de Ingrid Betancourt (ou, ao menos, a versão oficial dela: militares se infiltraram por um bom tempo entre as FARC e, aproveitando-se da acefalia e falta de informação derivada da morte e prisão dos líderes - cabeças - da organização, iludiram os guerrilheiros, dizendo estarem transferindo os reféns) é mais uma prova do erro que há na idéia de considerar a literatura (em sentido amplo) inútil - tese defendida não só por obreiristas de esquerda e direita, mas igualmente por letrados da mais alta categoria. Ou melhor, uma prova dos efeitos perniciosos que gera a inutilidade da literatura, entendida esta restritamente como um campo autônomo - romances, contos, poesia, crônica, movimentos, em suma, o que se aprende na escola sob a embalagem da disciplina "Literatura" (os "Clássicos", o que se ensina nas classes). Se aceitamos como base comum da arte (fazendo uso de uma definição grosseira, mas muito aproximada) a ficção, isto é, o (auto-)fingimento, a (auto-) fabulação, o (auto-)mascaramento (daí a Autopsicografia muito conhecida de Pessoa: "O poeta é um fingidor..."), teremos como conseqüência que ela não se limita aos campos estritamente artísticos, mas dominam todas as esferas da vida cotidiana, a começar pela política. Isto fica mais evidente na "sociedade do espetáculo" e na importância que adquiriram os marketeiros nas campanhas eleitorais, mas é tão antigo quanto a polis grega. Hannah Arendt, ao comentar o "espanto" que se abateu sobre a sociedade norte-americana indignada com as mentiras de seus dirigentes após a revelação dos "Pentagon Papers" (um relatório-calhamaço que demonstrava que o serviço de inteligência estava bem consciente do que se passava no Vietnã - ou seja, de que a vitória lá não só era quase impossível, mas mesmo sem necessidade econômica ou estratégica), faz questão de sublinhar, antes de mais nada, que o "uso da falsidade deliberada e da mentira definitiva como meios legítimos para alcançar fins políticos estiveram conosco desde o começo da história documentada": "Uma característica da ação humana é que ela sempre inicia algo novo, e isto não significa que se pode começar ab ovo, que se possa criar ex nihilo. Para abrir caminho para a ação, algo que estava ali antes deve ser removido ou modificado. Uma tal mudança seria impossível se não pudéssemos mentalmente nos remover de onde fisicamente estamos localizados e imaginar que as coisas possam também ser diferente do que elas de fato são. Em outras palavras, a negação deliberada da verdade factual - a habilidade de mentir - e a capacidade de mudar os fatos - a habilidade de agir - estão interconectados; eles devem sua existência à mesma fonte: a imaginação". A grande contribuição da análise da política grega por Arendt se centra neste ponto - para ela, a polis grega é uma espécie de espetáculo público (que teria, na modernidade, se privatizado), regido pelo direito de ver e ser visto pelos iguais (o Panóptico, por sua vez, cinde desigualmente esta reciprocidade: permite ver sem ser visto, no caso dos vigias, e obriga os disciplinados a serem vistos sem ter direito a ver quem os olha) (Maria Rita Kehl escreve sobre o assunto na coletânea - a quatro mãos com Eugênio Bucci - Videologias). Não interessa tanto que se possa chegar a um acordo dialógico (como a leitura habermasiana consensualista tão em voga hoje acredita) através da fala, mas que esta se constitua enquanto agir no ato mesmo de sua manifestação - ou seja, a fala é antes performance do que comunicação: "falar era compreendido a priori como uma espécie de agir. É verdade que o homem não pode proteger-se contra os golpes do destino, contra os golpes dos deuses, mas pode opor-se a eles e retrucar-lhes no falar e, se bem que esse retrucar não adianta nada, não mude a infelicidade nem atraia a felicidade, essas palavras pertencem ao acontecer como tal". É neste contexto que podemos propor ainda outra interpretação sobre o ato de censura arquétipo para o Ocidente que é o banimento dos poetas da República de Platão (há uma tradução para o inglês disponível no Projeto Gutenberg). Se, por um lado, no livro X, sob o argumento da efeminização que provoca a poesia, por esta se limitar a um ponto de vista (o que pode ser remediado pelo cálculo, isto é, por uma perspectiva asséptica - cisão que dura até hoje na prática acadêmica), ela não deve ser admitida, a não ser na forma de hinos aos deuses e louvores aos homens famosos, no livro III fica mais claro o que está em jogo: a poesia se baseia na mentira e esta é um pharmakon, uma droga (veneno-remédio) que, como tal, não deve ficar à disposição dos indivíduos privados, mas sim dos governantes que, no trato com os inimigos, ou mesmo com os cidadãos, podem mentir para o bem público. Carlos Astrada identificou aí a invenção da "mentira patriótica" (link para o artigo no original em espanhol) - eu iria mais longe e diria que estamos diante da invenção do monopólio da mentira. É o poder político que reside na ficção - negar a realidade, imaginar outra - que está sendo seqüestrado pelo "Estado" platônico. Que hoje o "capital-parlamentarismo" (expressão de Badiou) detenha, nas palavras de Guy Debord, o "monopólio da aparência" é uma mera conseqüência deste gesto inaugural. Por outro lado, que as FARC tenham nascido com um intuito revolucionário, isto é, ficcional, e sejam enganadas por um truque barato, prova a sua degeneração, a redução de seus integrantes a uma milícia incapaz de literatura, adepta por demais da hierarquia, sem capacidade de identificar a mentira (afinal, eles a deixaram ser monopilizadas pelos seus chefes). A literatura, a ficção não é inútil. Nunca foi. Ela é, sempre, a priori, política, independente de seu conteúdo (não se trata aqui de arte engajada ou não). Inútil é achar que só é literatura o que se ensina nas disciplinas com este nome. Inútil é achar que uma literatura em sentido estrito, inutilizada em seu isolamento, possa contrapor qualquer coisa. Tal isolamento inútil coaduna com o monopólio da mentira pelo Estado (ou pelo Capital): acostumados a vê-la em um canto específico da biblioteca, somos incapazes de ver como ela governa o mundo.
Tiqqun
Tradução para o espanhol: Mónica Silvia Nasi
Editora: Melusina[sic]
Ano: 2005 [2000]
"El Bloom es la Nada enmascarada, razón por la cual sería absurdo celebrar su aparición en la historia como el nacimiento de un tipo humano particular; el hombre sin atributos no es un determinado atributo de hombre, sino por el contrario el hombre en cuanto hombre, la realización final de la esencia humana genérica, que es precisamente privación de esencia, pura exposición y pura disponibilidad: larva".
(Os números entre parêntesis abaixo se referem à página do livro resenhado)
Hoje, 16 de junho, se comemora o
Bloomsday (aqui em Florianópolis, organizado por Sérgio Medeiros, Dirce Waltrick Amarante e
Victor da Rosa). Para o Tiqqun ("órgão
consciente do Partido Imaginário", ou ainda, "meio, um meio para constituir energicamente uma posição (...) anonimamente. Pois o
próprio de qualquer oposição verdadeira é o anonimato" (136)), não haveria
exatamente UM bloomsday, pois todos os dias seriam dias do(s) Bloom(s). Segundo Giorgio Agamben, com o termo
Bloom, o Tiqqun nomeia "a los nuevos sujetos anónimos, a singularidades
cualquiera, vacías, dispuestas a todo, que pueden difundirse por todos lados
pero permanecen inasibles, sin identidad pero reidentificables en cada momento.
El problema que se plantean es: '¿Cómo transformar el Bloom? ¿Cómo operará el
Bloom el salto más allá de sí mismo?'". O Bloom seria, por tanto,
aquilo que resta da dissolução das noções de identidade, comunidade, sujeito,
propriedade, qualidade, experiência: "el hombre sin raíces, el hombre que se siente en
el exilio como en casa, que se ha arraigado en la ausencia de lugar, y para
quien el desaraigo ya no evoca el destierro, sino, por el contrario, la
normalidad" (45). Mas não se trata de lamentar esta condição, ou
melhor, este Stimmung da ausência de Stimmung, tonalidade afetiva da ausência
de tonalidades afetivas, forma-de-vida da ausência das formas de vida, mas de
ver que o Bloom, enquanto abertura de possibilidades, "lleva en sí la ruina de
la sociedad mercantilista. Descubrimos en él esse
carácter ambivalente, ese sello que llevan todas las realidades a tráves de las
cuales se manifiesta la superación de la sociedad mercantilista en su propio terreno" (93). Ou seja, mais do que lamentar a identidade perdida do sujeito, o Tiqqun,
com sua Teoria
do Bloom ("La
teoría no es del pensamiento, cierta cantidad coagulada, manufacturada, de
pensamiento. La teoria es un estado, un estado de estupefación. Teoría del Bloom donde el Bloom no es el objeto de la teoría [,] donde la teoría
no es sino la actividad más familiar, la tendencia espontánea de una criatura esencialmente teórica,
de un Bloom. La teoría NO TIENE FIN. De ahí, la necesidad de PONERLE FIN, decididamente" (126-127)), pretende fazer uso desta condição: "Romper con la antigua angustia del 'quién soy
realmente?', en beneficio del conocimiento de mi situación y de su uso
posible": "No luchar contra el estado esquizoide dominante, contra nuestro estado esquizoide, sino partir de ahí, usarlo como pura facultad de subjetivación y de desobjetivación, como
aptitud para la experimentación" (128). O grande problema, porém, são os modos
pelos quais o Biopoder e o Espetáculo, conjugados na "forma contemporánea de la
dominación (...), esencialmente productiva"
("Por una parte, rige todas las manifestaciones de nuestra existencia (el Espectáculo); por otra, administra las condiciones de ésta (el Biopoder))" (29), conseguem deter a potência
histórico-genérica do Bloom. Um destes dispostivos de captura é a Metrópole
("Nunca se había visto reunido semejante número de hombres, pero tampoco
estuvieron nunca hasta tal punto separados" (48) - sobre o assunto, conferir a
aula magna de Agamben, traduzida pelo amigo Vinícius Honesko, no Flanagens);
outro é a Mobilização Total, a exceção permanente: "La primera de estas
contradicciones [produzidas pela Mobilização Total] se debe a que su desarrollo
exige, en un mismo movimiento, la producción de posibilidades cada vez más
amplias y la prohibición general de su actualización. La dominación
mercantilista debe pues producir, al mismo tiempo que una sobreabundancia de
medios, la sobreabundancia de terror necesaria
para que nadie se sirva de ellos. El Bloom es el hombre de este terror, quien
lo infunde y quien lo sufre: el co-laborador"
(64-65). Ou seja, ao contrário dos discursos de senso comum que insistem na imediaticidade da mídia, o espetáculo é a produção constante de mediações, que
inviabilizam o acesso àquilo que prometem: "Cada desarrollo de la sociedad
mercantilista exige la destrucción de cierta forma de inmediatez, la separación
lucrativa en una relación de aquello que estaba unido. Es
esta escisión lo que la mercancía viene luego a investir, lo que mediatiza y de
lo que saca provecho" (42). O resultado só pode ser uma galvanização da
identidade, em que afirmação e guetificação, cultura e mercado se confundem:
"El febril entusiasmo por la producción industrial de kits de personalidad, identidades desechables y demás naturalezas
histéricas parece ineluctable. En lugar de considerar su vacío central, los
hombres, en su mayoría, retroceden ante el vértigo de una ausencia total de propiedad, de una indeterminación radical y, por consiguiente, en el fondo
retroceden también ante la sima de su libertad. Prefieren incluso sepultarse en
la mala substancialidad, hacia donde, ciertamente, todo los empuja. Podemos
prever cómo descubrirán, en el recodo de una depresión larvada de forma
desigual, tal o cual raíz enterrada, tal o cual pertenencia espontánea, tal o
cual incombustible atributo. Francés, marginal, mujer, artista, homosexual,
bretón, ciudadano, bombero, musulmán, budista o parado; todo sirve si les
permite berrear de un modo u otro, parpadeando hacia el infinito, el milagroso
'YO SOY...'" (66-67). Diante disto, a tarefa política consistiria em desativar
estes dispositivos de captura do nada que é o Bloom, ou seja, o comunismo,
entendido como "una disposición a dejarse afectar, en contacto con otros seres,
por lo que nos es común. Una disposición a compartir lo común" (133). Dar a ver o comum, produzir o comum, a abertura genérica (o cancelamento das determinações, i.e., a
possibilidade de fazer história) que caracteriza o homem: assumir o Bloom: "Último hombre, hombre de la calle, hombre de la multitud, hombre de
las masas, hombre-masa, así es como en un principio UNO nos había presentado al Bloom: como el triste
producto del tiempo de las multitudes, como el hijo catastrófico de la era
industrial y del fin de todos los hechizos. Pero entre esas designaciones,
también hallamos ese estremecimiento. UNO se estremece ante el infinito misterio del hombre común. Cada cual presiente que tras el teatro de sus atributos se esconde una potencia pura; una potencia pura que supuestamente todos
hemos ignorado. Queda la inevitable inquietud que creemos apaciguar
exigiéndonos unos a otros la rigurosa ausencia de sí, ignorando esta potencia común que, por ser anónima, se ha vuelto incalificable. El Bloom es el nombre
de ese anonimato" (12-13). O comunismo não é uma reorganização da produção,
mas a desativação de toda produção, a conversão do mundo em uma festa, ou
melhor, a conversão de todo dia
"Bloom: [blum] n.m. - v. 1914;
origen desconocido, acaso del ruso Oblomov,
del alemán Anna Blume, o del inglés Ulises - 1) Stimmung final de una
civilización inmovilizada en su propio lecho, que sólo consigue distraerse de
su naufragio mediante la alternancia de frases cortas de histeria tecnófila y
largas playas de astenia contemplativa. Era
como si la masa exsangüe de asalariados viviera en el Bloom. '¡Muerte al Bloom!'
(J. Frey); 2) Fig. Forma de vida crepuscular, vacante que, por lo general,
afecta a los humanos en el mundo de la mercancía autoritaria à bloomesco,
bloomitud, bloomificación; 3) por ext. Sentimiento de ser póstumo. Sentir el bloom; 4) Acta de defunción de
la política clásica; 5) Acta de nacimiento de la política extática; 6) Hist. Aquello cuya asunción determinó la
formación de los distintos focos del Comité Invisible, conjura anónima que,
mediante sabotajes y levantamientos, acabó liquidando la dominación mercantil
en el primer cuarto del siglo XXI. 'Cuando pasa el tren, los espectadores se
quedan petrificados.' (K.)"
Tiqqun (órgão consciente do Partido Imaginário), Teoría del Bloom (tradução ao espanhol por Mónica Silvia Nasi - Editora Melusina[sic], 2005).
(General Márcio Matheus Madureira, chefe do Estado Maior do Comando Militar do Leste, em referência a reserva indígena Raposa/Serra do Sol, 16 de abril de 2008 - Fonte: O Globo Online)
LEGENDA
"Os direitos deles precedem os nossos. Nós reconhecemos isso ao dar aos índios direitos históricos sobre as terras que ocupam. Essa discussão é inteiramente viciada por uma mistura de interesses, que estão se fundindo na imaginação e na mídia, dos grandes produtores de arroz, cana e soja, que não têm em mente a pátria como questão. Entre os patriotas profissionais e os empresários, cujo única religião é o dinheiro, está havendo uma estranha convergência de opiniões, que só pode estar baseada num equívoco e na ingenuidade, que eu não diria recíproca."
(Eduardo Viveiros de Castro, antropólogo, em entrevista a Folha de S. Paulo, 01 de junho de 2008 - Link (só para assinantes),onde também diz, a respeito da agressão sofrida por um engenheiro da Eletrobrás pelos índios: "Talvez o que redima os índios, e o que os tem mantido vivos até hoje, seja o fato de não estarem excessivamente acostumados à humildade e à obediência e que ainda conseguem reagir")
Este blog tem como seu propósito principal buscar, na forma de um work-in-progress discutido e debatido, um conceito de censura que não se limite à "mera" proibição ou restrição, uma idéia de censura, para dizê-lo em poucas palavras, intimamente ligada ao consenso. Acredito, porém, que esta reconceituação - e recontextualização - da censura como prática que visa o consenso, também permite ler melhor as proibições, a censura em sentido estrito. Por isso, me aventuro a falar duas ou três coisas sobre a recente proibição, pelo Judiciário, da exibição, em blogs, de banners em apoio a candidatura de Fernando Gabeira à prefeitura do Rio de Janeiro (por exemplo, o de Pedro Dória). Mas ao invés de uma análise pontual do caso (afinal, já estava tudo ali há dois meses atrás, como bem previu Idelber Avelar, anti-apocalíptico declarado, mas nada ingênuo), prefiro inseri-lo numa série maior de censuras vindas do Judiciário - o caso Roberto Carlos/Paulo César Araújo, a proibição de uma ala e de um carro alegórico da Viradouro esse ano (mas também o caso do banner Xô Sarney!, o caso do vídeo da Cicarelli, etc) -, série esta que está longe de terminar; antes, tem tudo para crescer exponencialmente. Por que?
Creio ser essencial entender o
cenário jurídico em que estas decisões se situam. Como tem pesquisado com muita
propriedade o amigo Leonardo D'Ávila (uma pequeníssima amostra do seu argumento
pode ser encontrada em comentário a um post d'O biscoito fino e a massa),
vivemos um estado de inflação normativa, cuja contrapartida é a ausência de
qualquer parâmetro decisório. Excesso de
regras: para dar conta da "aceleração do tempo", da demanda criada por novas
situações "supostamente" não-reguladas (e a rede é um caso paradigmático neste
sentido), da complexificação da vida, etc, proliferam-se regras jurídicas de
todos os níveis, mas como o processo legislativo em sentido estrito - a criação
de leis pelo Legislativo - é, naturalmente, lenta (independentemente da vontade
dos legisladores), geralmente a resposta vem em regulamentos, instruções,
resoluções, portarias (uma inflação de regras que ultrapassa qualquer cenário kafkiano),
etc., em suma, em uma série de normas jurídicas que não são propriamente leis,
mas que são aplicadas como se tivessem força de lei. Exceção decisória: o recurso, pelo Judiciário, aos princípios, a um
nível supra-legal (as decisões dos casos
da Cicarelli, Roberto Carlos/Paulo César Araújo, e Viradouro se inserem aqui), ou
à regulação infralegal (o caso mais recente dos blogs/Gabeira - devemos lembrar
que o TSE criou a resolução que a própria Justiça Eleitoral aplicou; Código
Eleitoral, i.e, lei pra quê?) se dá justamente porque o cenário de inflação
normativa arruína o parâmetro de legalidade, arruína a lei, em sentido estrito,
como parâmetro, como um marco ao redor do qual uma estabilidade, uma
normalidade podem ser estabelecidos (não é o caso aqui de sublinhar que mesmo a
lei não é um parâmetro tão estável, na medida em que toda decisão judicial,
mesmo enquanto aplicação de uma norma a uma situação, implica discricionariedade
ou mesmo arbitrariedade, em suma, de ficção - senão poderíamos facilmente
substituir nossos juízes por máquinas e abdicar do processo legal -; em todo
caso, a lei é um ponto muito mais fixo em torno do qual discutir as decisões
judiciais do que a nuvem de gafanhotos em que se converteu a nossa normatividade
atual). Na ausência (ou melhor, na "suposta" ausência) da lei, as decisões
judiciais, cada vez mais, se sustentam em níveis infra ou supra legais, ou
seja, decidem sobre situações não normais,
mas excepcionais, utilizando não leis, mas normas que aplicam como se tivessem
força de lei. Poder de polícia: é
aqui que entra a proliferação de decisões censoras. Como o parâmetro de
legalidade está arruinado, como a lei que, no fundo, não passa de um limite,
isto é, demarca o que é proibido e o que é permitido, não está disponível, a
decisão sobre o que pode e o que não pode recai cada vez mais nas mãos dos juízes
que - desculpem a repetição, mas não custa enfatizar - não tendo o instrumento
legal em que se apoiar, atuam como censores, isto é, decidem caso a caso o que
pode e o que não pode. Devemos lembrar que a censura sempre se prolifera em
situações de exceção - não só nas ditaduras, mas nas emergências fabricadas,
como o McCartismo que acabou com o comunismo norte-americano -, onde a lei é
suspensa e vige somente uma força de lei sem lei (e o estado de inflação
normativo que atravessamos gera esta situação de exceção). É preciso que o
princípio de que ninguém pode alegar/invocar o desconhecimento da lei faça
algum sentido (o que hoje não faz) para que a censura não se espraie. Na exceção,
a política (a lei) se converte em polícia (força de lei). Quanto ao poder de
polícia: 1) como descreveu Walter Benjamin, a polícia se caracteriza não só por
impor uma ordem, como por criar uma ordem para uma situação não prevista; 2) não
devemos confundir polícia com a instituição uniformizada: por muito tempo, a ciência
da administração pública era conhecida como "polícia", e até hoje, no direito
administrativo se fala em poder de polícia: de fiscalização, de registro de
atos, de discricionariedade, de aplicação de sanções, e de autocoercibilidade, ou seja, de aplicar a
norma ou de criar uma norma para uma nova situação; 3) devemos lembrar que o
censor, na Roma Antiga, é um cargo cujas funções são justamente estas (fiscalizar,
registrar, contabilizar, zelar, proibir - e daí a nada ambígua relação entre
censo (registro) e censura (proibição)), ou seja, ele encarna o poder policial.
Na exceção, os juízes não decidem tendo como base uma lei que pode ser discutida e é
conhecida por todas; na exceção o juiz é um policial, é um censor.
P.S.: O que quero sublinhar é que não acredito que seja útil discutir ISOLADAMENTE o caso de censura aos blogueiros apoiadores de Gabeira - resolve-se o problema aqui, ele emergirá acolá. Seria preciso repensar um marco de legalidade, resolver o problema da inflação normativa, etc. Pessoalmente, porém, não acredito que seja possível um "retorno" à legalidade.
P.S.2: Devo a associação entre poder de polícia e censura a uma conversa que tive com Lyn Jackson Tatt, numa dessas maravilhosas experiências transoceânicas que a rede e o acaso conjugados podem proporcionar.
P.S.3: Para uma descrição do poder de polícia tal como entedido pela ditadura instaurada em 1964, vale a pena ler o texto de Hely Lopes Meirelles: Poder de polícia e segurança nacional, conferência pronunciada na Escola Superior de Guerra em 1972. Não por acaso, ele continua sendo um dos autores mais citados no Direito Administrativo.
Paulo Arantes, Diccionario de bolso do Almanaque Philosophico Zero à Esquerda, 1997
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