O SOPRO 33 apresenta cinco fragmentos de Furio Jesi sobre a relação entre mito, imagem e linguagem, publicados pela primeira vez em 1999, na revista Cultura Tedesca (em organização de Giorgio Agamben e Andrea Cavalletti) e aqui traduzidos por Diego Cervelin.
Além disso, uma resenha de Del deporte y los hombres, de Roland Barthes, escrita por Victor da Rosa.
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UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), 2001 (ou 2002, não me lembro direito): estoura uma grande greve de servidores (e talvez também professores, também não lembro, mas a greve foi enorme, durou meses, e teve ocupação do Núcleo de Processamento de Dados da Universidade, o que gerou uma encrenca com o governo estadual, porque o tal NPD prestava um serviço indispensável à administração estadual), que imediatamente paralisa as atividades da Universidade, esvaziando-a. Os "estudantes", provavelmente por intermédio do CEB (Conselho de Entidades de Base, que reúne os dirigentes dos Centros Acadêmicos) decidem chamar uma assembléia pra decidir a sua "participação" ou "posicionamento" sobre a greve. Os vinte gatos pingados presentes (provavelmente um integrante de cada umas das 8 facções de esquerda, acompanhado de seu devido pupilo doutrinado, uns dois militantes pagos do PCdoB - fáceis de identificar, são uns caras cabeludos de 30 anos de idade que já fizeram milhões de cursos em universidades diferentes, e que você encontra a qualquer hora do dia em qualquer lugar da universidade, como se eles tivessem o poder de estar em vários lugares ao mesmo tempo -, mais uns dois integrantes do DCE - Diretório Central dos Estudantes - que, à época era dirigido por um grupo de anarco-artistas e "bichos-grilo"), decidem, então, que também entrariam em greve, não só em apoio às reivindicações salariais dos servidores, mas também com uma pauta própria de reivindicações (a maioria legítima e até hoje não atendidas). Em vez de aqueles vinte declararem que aqueles vintes apoiariam a greve (como, de fato, fizeram, participando dos protestos, do acampamento no NPD, etc.), coletivizaram a decisão, e, então - conseqüência lógica - os cerca de trinta mil estudantes da Universidade naquele dia entraram em greve por decisão da Assembléia Geral (sic) dos Estudantes.
Passam-se alguns meses, servidores entram em acordo com o governo e saem da greve. Um calendário de reposição de aulas é discutido e aprovado, e tudo volta à normalidade. Umas semanas depois de toda a Universidade estar funcionando regularmente, ocorre uma reunião do CEB, com mais ou menos os mesmos integrantes da "Assembléia". Um dos "bichos-grilo" se "inscreve" para falar e decide usar seu tempo para ficar em silêncio. Vaias dos integrantes das facções e de seus pupilos (mais destes do que daqueles). Ninguém respeita a "fala" do bicho-grilo. Seguem-se algumas discussões (não lembro sobre o quê, mas com certeza foram muitos "informes" e provavelmente algum assunto que nunca falta nessas reuniões, como o apoio à Cuba, essas coisas), até que outro "bicho-grilo" se "inscreve" e decide falar. Argumenta que ele - como os estudantes em geral - ainda estava em greve, afinal nenhuma Assembléia - o órgão máximo dos estudantes - havia decidido pôr fim à paralisação. Vaias, gritos histéricos dos burocratas das facções; "Isso é piada!", diz um deles.
De fato, tudo já estava normalizado e os estudantes assistiam todos às suas aulas. Mas é verdade também que, formalmente, aquela greve dos estudantes nunca terminou. Na verdade, ela nunca começou - só que isso, apesar de ser tão óbvio quanto a lógica da argumentação do "bicho-grilo", era mais complicado de fazer aqueles burocratas entenderem. A recusa dos burocratas ao silêncio era uma recusa do vazio de sua própria representação, da sua própria insignificância - uma recusa da sua falsidade ideológica.
Quem esperava que o casal 20 da Rede Globo deixasse de lado a postura PittBull que exibiu diante de Dilma e Marina pra entrevistar Serra, se enganou - e se esqueceu que tal postura já se revelou com todos os candidatos na série de entrevistas de 2002 e/ou 2006. Pode ser que tenha havido mais boa vontade com Serra, mas o tom inquisitivo, como se tivessem questionando um acusado, se mostrou também diante do candidato tucano. É uma forma de, supostamente, demonstrar independência, igualando "independência" à ferocidade de um inquérito policial (e uma tendência no "jornalismo" que se vê também em programas estúpidos como o Pânico ou o CQC). Mesmo assim, as entrevistas da Vênus Platinada trabalharam, de "forma" "independente", contra Lula. Para os dois candidatos não-petistas, foram feitas perguntas sobre o "mensalão petista", ainda que até hoje não se saiba o que foi aquilo que chamam de "mensalão". Pouco importam as respostas dos entrevistados. O que importa é recolocar em circulação um significante que, independente de seu significado concreto, possui uma carga negativa e produz uma associação imediata ("mensalão" = corrupção; mensalão aconteceu no governo Lula; Governo Lula é corrupto). A maior amenidade da Globo com Serra pouco importa quando a Vênus Platinada, mostrando "independência", recauchuta um significante vazio que só beneficia um dos lados da disputa.
1. Alguns meses atrás, ouvi de um amigo que Marina Silva, ao não tocar nos problemas que São Paulo passou naquela época de fortes chuvas (já não lembro ao certo o mês, mas a entrevista de Marina a que se referia meu amigo foi dada no mesmo período), estava fazendo o que se esperava dela, afinal "como ela iria falar mal de seu chefe?". O "chefe", é claro, seria José Serra, e o que motivava a ligação Marina-Serra era o fato (ou a hipótese) de que a candidata do PV, roubando votos da candidatura petista, servia aos interesses de Serra.
2. Hoje, no Vi o Mundo, o Azenha sugere que tucanos e Globo decidiram inflar a candidatura de Plínio para, assim, tentar levar a eleição ao segundo turno. A conclusão, implícita - e explicitada pelos comentaristas do post -, é óbvia: Plínio está sendo usando para o jogo demo-tucano.
3. Objetivamente, os dois raciocínios são válidos - com a ressalva de que são válidos apenas se aceitarmos a premissa de que só existem dois pólos disputando. Todavia, Marina e Plínio, se acabam servindo à candidatura tucana, não estão alinhados com o pólo demo-tucano. São casos bem diferentes daqueles em que alguém supostamente fora da polaridade petucana adota um dos lados: o caso de Gabeira na eleição municipal, e, agora, novamente, na estadual; é o caso também de Heloísa Helena na eleição em 2006, na medida em que seu discurso praticamente se restringiu à moralização pós-mensalão; e seria o caso da candidatura de Ciro Gomes ao governo de São Paulo, impedindo a vitória de Alckmin no primeiro turno, e possibilitando a vitória de Mercadante no segundo - aliás, é incrível como o PT faz questão de não governar o estado paulista, rifando novamente Eduardo Suplicy.
4. É claro que a subida de Marina e Plínio agora servem à Serra (como poderiam servir à Dilma, se Serra estivesse a ponto de levar a eleição no primeiro turno). Agora, isso não autoriza alguém a chamar Serra de chefe de Marina, ou de vincular a candidatura de Plínio aos interesses petucanos sem mais. Antes de tudo, a subida Marina serve à Marina e a subida de Plínio serve à Plínio. E mais: a subida dos dois serve justamente para tentar quebrar a lógica dualista que rege as análises petucanas. Uma boa posição de Marina e Plínio força as suas plataformas a serem, se não ouvidas e acatadas, ao menos levadas em consideração no segundo turno (aliás, quando Marina lançou sua pré-candidatura, alguns dias depois, Dilma já estava por aí falando de meio-ambiente). Só um maniqueísmo tosco desconsidera isso.
O Sopro 32, dedicado a Sergio Chejfec, está no ar com:
- entrevista com o escritor argentino, conduzida por Dianna Niebylski e
- Relatos da reflexão hesitante, o prólogo de Idelber Avelar para Boca de Lobo, único romance de Chejfec traduzido ao português (o texto já havia aparecido no Biscoito - que, segundo o mestre, voltará dentro de alguns dias - e no blog da editora que publicou a tradução, a Amauta).

O SOPRO 31 está no ar, totalmente dedicado a'Os anões, de Veronica Stigger: um fragmento do livro, o conto Tatuagem, e duas resenhas dele - Do espetáculo sem desculpas, por Flávia Cera; e Genealogia bastarda de Veronica Stigger, de minha autoria.
P.S.: O servidor que hospeda esse blogue ficou fora do ar semana passada, e na volta sumiram dois posts. Um deles era a chamada pro SOPRO 30, que continuava o Debate sobre a Anistia, com Nem justiça nem transição, texto de Pádua Fernandes. O segundo era a menção a dois exemplos de como as teses de Agamben sobre o estado de exceção e o campo de concentração são mais do que atuais, e de como esse estado de coisas se entrelaça à sociedade do espetáculo, mais especificamente à Copa do Mundo (e tem gente que se acha progressista que comemorou a escolha do Brasil como sede em 2014, esquecendo que, para parafrasear Fernando Vanucci, o estado de exceção é logo ali, no caso, aqui): 1) a criação de campo de concentração para pobres, para onde moradores da Cidade do Cabo foram removidos para não enfeiarem a cidade durante a Copa e sobre o qual Murilo Corrêa se debruçou; 2) a criação de tribunal de exceção para julgar certos crimes relacionados à Copa do Mundo, exigência da FIFA ao que parece.
"O Chefe -Vamos matar todos os nossos desafetos!A forca sorri.A multidão (Urrando) - Vamooooos! Vamoooooos! Abaixo os desafetos! Abaixoooooooooooo!O Chefe - Os indiferentes também!A multidão - Vamoooooos! Abaixo os indiferentes! Mataremos todos!O Chefe - Vamos dizer que são todos comunistas!A multidão - Vamooooooooos!"
(Oswald de Andrade, Panorama do fascismo, 1937)
Legenda
"Primero vamos a matar a todos los subversivos, después a sus colaboradores; después a los simpatizantes; después a los indiferentes, y por último, a los tímidos."(General de Brigada Iberico Manuel Saint Jean, governador de Buenos Aires, 1976)
O SOPRO vem em edição dupla, com o texto O declínio e a queda da economia espetacular-mercantil, de Guy Debord, em tradução de Rodrigo Lopes de Barros Oliveira e Leonardo D´Ávila de Oliveita (a tradução havia sido publicada anteriormente no site Centopeia.net). O texto aborda a chamada Revolta de Watts (Watts Riot), ocorrida no bairro negro de Los Angeles, em 1965, e seu sentido político amplo dentro da sociedade do espetáculo.
Semana cheia de coisa interessante (na Universidade) pra quem está em Florianópolis:
Semana de Letras
Christopher Dunn
O professor de Tulane (onde trabalha com Idelber Avelar) e autor de Brutalidade Jardim, considerado por Zé Celso o melhor livro sobre a Tropicália, proferirá duas conferências que integram o evento O pensamento no século XXI:
- Hoje (24 de maio) - 19 hrs, no Auditório da Reitoria da UFSC
"A arte é uma extensão do corpo. Eu expliquei pro polícia tudo: Waly Salomão e a contracultura brasileira" - Amanhã (25 de maio) - 10 hrs, no Auditório da Reitoria da UFSC
"Três Modernidades Tropicalistas"
Semana de Letras
- Amanhã (25 de maio) às 18:30, na Sala Carlos Drummond de Andrade, no Bloco B do CCE/UFSC
Cinema e Literatura Brasileira, mesa-redonda com Joca Wolff, Cláudia Mesquita e Jair Fonseca - Quarta (26 de maio) - às 10:30, no Auditório do Bloco B do CCE/UFSC.
O velho e o novo. A superação nos estudos de letras, palestra de Raúl Antelo
Last, but not least, um auto-jabá: - Sexta (28 de maio) às 14:20 na Sala 201 do CCE/UFSC.
- marioswald(s): Antropofagia - ontem. hoje. amanhã. GT coordenado por Flávia Cera e do qual participarei, Aos interessados, mais informações:
Resumo: A Antropofagia nasce sob o signo da metamorfose: "marioswald", autonomeação híbrido-composta utilizada pelos dois "pontas-de-lança" de nosso modernismo e recorrentemente invocada nas reapropriações posteriores do canibalismo político-cultural. Por isso, ela nasce também sob o signo da impropriedade, da impossibilidade de fixar uma identidade estável: dentre as peculiaridades da Antropofagia do final da década de 1920, está o fato - pouco percebido pela crítica - de que não há, a rigor, nenhuma obra antropofágica (se Macunaíma era reivindicado pelo "movimento" como sua obra-prima, seu autor, Mário de Andrade, negava veementemente o rótulo e foi, além disso, constantemente atacado pelos antropófagos; Cobra Norato, de Raul Bopp, e o par de romances Miramar/Serafim, de Oswald de Andrade, foram gestados muito antes da Antropofagia; e os quadros de Tarsila do Amaral, muito mais que inspirarem-se no ideário do grupo, foram a sua inspiração). Ao contrário da Poesia Pau-Brasil, fundada na idéia de invenção, i.e., de uma apropriação visando à propriedade, à criação de um legado que possa ser transmitido e inventariado, a Antropofagia define-se como prática sem obra, como um meio sem fim, como um objetivo sem objeto, que aparece/acontece em uma temporalidade não-redutível à linearidade cronológica que funda o tempo da transmissão da propriedade (ou seja, da tradição).
- Da invenção da invenção à posse da posse: Pau-Brasil e Antropofagia
Alexandre Nodari (doutorando CPGL/UFSC) - Saneamento Básico: da lama ao caos
Flávia Cera (doutoranda CPGL/UFSC) - O modernismo nasceu na zona: em torno d'O perfeito cozinheiro das almas deste mundo'
Victor da Rosa (mestre pelo CPGL/UFSC) - Antropofagia e obnubilação. Gregório de Matos e o daimon
Diego Cervelin (mestrando CPGL/UFSC) - Antropofagia e Perspectivismo literário: o outro canibal em Rosa e Mussa
Ana Carolina Cernicchiaro (doutoranda (CPGL/UFSC) - O banquete de Mário de Andrade diante do espelho: questões do corpo híbrido
Evandro de Sousa (mestrando CPGL/UFSC) - Do outro lado do rio: Oswald de Andrade e Paulo Duarte
George França (doutorando CPGL/UFSC)


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